terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

A casa das recordações

Seguia por uma rua, minhas lembranças apontavam para um lugar na infancia, mas o lugar não se parecia com a lembrança. A cada esquina, buscava por sinais de familiaridade, mas via apenas prédios comerciais, ou condomínios luxuosos, cheios de segurança e praticamente impossíveis de se espiar. Continuava andando, e comecei a ver algumas pessoas conhecidas, mas para meu terror, elas não me reconheciam. Procurei por um espelho, queria saber se eu estava tão diferente, mas não o encontrei, busquei pelo meu reflexo nas vitrines, sem sucesso... Como eu podia lembrar das pessoas e não ser recíproco? Abordei algumas pessoas, mas todas olhavam com estranheza e continuavam seus afazeres.

Corri em busca de uma resposta, e tudo que encontrei, foi um lugar vazio, uma natureza morta e humanos sem viço, olhares frios, parados, olhando para lugar algum, tive dúvidas se podiam enxergar ou mesmo ouvir. Eu sabia que precisava chegar a um casebre que vi ao longe, algo me dizia que encontraria ali o que tanto buscava. O sol dividia o céu com a lua, estava em um momento entre o dia e a noite, segui adiante, afastando-me da cidade de lembranças esquecidas. A estrada era de terra batida, como se muitos carros por ali passassem, sua proximidade com a cidade gerava um grande contraste, mas tudo que fiz foi andar.

Quando cheguei ao casebre, ele não parecia tão pequeno, foi como se houvesse crescido no caminho, ficou majestoso e minha curiosidade misturava-se a angustia. O que quer que encontrasse ali, esclareceria todo o mistério da cidade. Bati a porta, e meu toque parecia ecoar no vazio. Insisti, bati mais e mais, cada vez com mais força, quando ouvi passos do outro lado. Sim!! Alguém estava vindo!! Ouvi vários trincos e fechaduras serem destrancados, e a porta se abre num rangido fúnebre. Espero ansiosa pelo rosto do anfitrião, mas, para minha surpresa, não há ninguém. Entrei, mesmo sem convite, chamei sem resposta, estava em uma sala cujas paredes estavam abarrotadas de retratos de paisagens, casas, pessoas, animais. Segui para a próxima sala, e a mesma estava coberta de manuscritos colados as paredes, e muitos livros em prateleiras, na mesa, no chão, nas poltronas. Olhei rapidamente em cima da mesa, peguei uma carta, mas não a li, e segui para a próxima sala, e para minha surpresa ali havia apenas um enorme baú. Abri facilmente, e dentro dele encontrei dois arcanos: o hierofante e os enamorados.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

A maçã

Era uma vez um pequeno ser, não tinha corpo, era apenas uma aura luminosa, cujo tempo de voltar a Terra havia esgotado-se, mas ainda não havia conseguido.

Desde então morava ao lado daquela que seria sua geradora, sua força, caminhando noite e dia como uma fiel guardiã, esperando uma oportunidade para ser parte de sua protegida. Tentava de tudo para aproximar-se mais e concluir seu intento, e quanto mais tentava, mais enfraquecia, estava prestes a desanimar, não conseguia entender por que tantas muralhas começaram a crescer em seu caminho, não conseguia mais transpor ou mesmo chegar perto, começou a extinguir-se e perder-se. Pensou em desistir.

Um dia porém, teve uma oportunidade única, conseguiu atravessar um portal, não sabia aonde chegaria, imaginou uma nova chance, arriscou-se, e através da passagem conseguiu chegar aos sonhos de sua mãe! Ela estava parada, sentada embaixo de uma macieira, um livro em mãos, tinha os cabelos longos, e um ar tranquilo. Aquela era sua oportunidade, mas ainda não sabia ao certo o que poderia fazer. Precisava chamar a atenção de sua mãe, mas precisava ser prudente, não podia assustá-la, teria que chegar de mansinho, e deixar um recado.

Chegou mais perto, pisando em algumas folhas secas, e pequenos galhos no chão, seus passos fizeram com que sua mãe parasse a leitura, e levantasse o olhar, procurando em volta, até que parou olhando fixamente em sua direção. Sua mente parecia um turbilhão, suas emoções pareciam não ter controle, rapidamente mostrou-se como uma criança, uma menina, de uns 2 anos, de cabelos longos e pretos, e olhos enormes, que conseguiu apenas expressar um sorriso. O livro fora fechado, a atenção voltada para si, uma maçã caíra, mas continuaram se encarando, ela sabia, simplesmente sabia, nada havia sido dito, mas em seus olhos, lágrimas brotaram. Ela meneou a cabeça em negativa, era difícil entender aquele gesto, por quê?? Qual o sentido, qual sua razão? O que havia feito? Tínhamos um acordo não se lembra ? Ela tampou o rosto com as mãos para esconder as lágrimas, não queria mais encará-la, queria fugir, mas não se levantava. Como criança, conseguira chegar mais perto, abaixou-se, pegou a maçã, e a entregou a sua mãe, ela não queria aceitar, suas lágrimas não paravam, então, com um peso em seu peito, deixou a maçã em cima do livro, deu-lhe um beijo, e caminhou de volta ao portal, antes de entrar, deu um beijo em sua palma e o soprou para sua mãe, que a encarava ao longe.

O recado estava dado.
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